domingo, 17 de outubro de 2010

cura



a ferida ainda se encontra aqui, aberta. percebe-se que, das extremidades ao núcleo, os processos naturais já se incumbiram de fazer sua parte. há uma espécie de crosta que fica depois que a lava do vulcão desce montanha abaixo. os rastros da mágoa e da dor.

jogo a responsabilidade sem me dar conta, pro tempo que há por vir. embora eu já tenha dito e redito que o passado e o futuro são também presente. o futuro especialmente repleto de faltas e ausências... acreditas ainda que serão repostas?

me atraso pelo meu astrológico desejo de dor e pela minha inabilidade natural com as perdas. abriu-se o baralho e como eu pude crer num futuro fadado às falsidades? em nossos jogos, os caminhos [para mim], os percursos [pra ti] e as tempestades. mas não acho que só eu viva feito alma solitária em cais abandonado. talvez você também. anote, pois estou admitindo aqui e agora o que eu jamais poderia dizer, eu que sempre soube do grito, do sangue, do fim, da inexistência do eterno. é que fui deus por uns instantes e decidi sobre o tempo.

eu já me despedi de alguém que não conhecia mais.
se fossemos tão bons quanto julgavamos ao, presunçosamente adivinhar o tempo, teríamos sabido a hora de cessar. a hora inevitável porém muito evitada de dizer: não!
o mesmo não que eu creio faltar-lhe mais que a mim.

ontem fui ao parque que carregou com perfume teu a atmosfera que se forma embaixo das copas de suas centenárias árvores. havia tanta vida! e tanta morte! até a rosa, se não arrancada, deixa marca de sua passagem no galho.
respirei fundo, pois a partir de agora, nossa visita será esquecida! eu sei que, as palavras são virtuais como meus sentimentos adormecidos que tento aos poucos, substituir.
sentei no banco que sentamos juntos. mas que pena eu ter fotografado! fotografia é microsegundo congelado.
tudo bem, aceito que aquele banco seja eterno.
mas as visitas que fiz à minha mente, ao andar por trilhas abertas por nós, agora serão vazias, esquecidas. amanhã mesmo voltarei ao parque, para que então, minha memória crie histórico e aos poucos, assisto você se afastando. como quem chegou atrasado e perdeu o bonde. aos poucos, o trem caminhará, e lentamente nossos olhares trilharão rumo à linha do horizonte.


Peito Vazio
(Cartola)

Nada consigo fazer
Quando a saudade aperta
Foge-me a inspiração
Sinto a alma deserta
Um vazio se faz em meu peito
E de fato eu sinto
Em meu peito um vazio
Me faltando as tuas carícias
As noites são longas
E eu sinto mais frio.
Procuro afogar no álcool
A tua lembrança
Mas noto que é ridícula
A minha vingança
Vou seguir os conselhos
De amigos
E garanto que não beberei
Nunca mais
E com o tempo
Essa imensa saudade que sinto
Se esvai

*

3 comentários:

Camila Nakamura disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Camila Nakamura disse...

Que cada segundo eternizado seja sempre uma boa lembrança, guardada em sua mais pura essência, repleta de floreios e romances que não existem mais.

Camila S. disse...

A presença da ausência é o que mais cutuca a ferida aberta da dor que se acreditava acabada.